quarta-feira

Biografia das mulheres  estudantes e professoras  UFRJ mortas e desaparecidos pela Ditadura Militar 

  
ANA MARIA NACINOVIC CORRÊA

MILITANTE DA ALIANÇA LIBERTADORA NACIONAL (ALN)

Nasceu em 25 de março de 1947, no Rio de Janeiro, filha de Mário Henrique Nacinovic e Anadyr de Carvalho Nacinovic.
Fez o curso primário, ginásio e científico no Colégio São Paulo, de freiras, em Ipanema/RJ.  Aos 21 anos, ingressou como 2ª colocada na Faculdade de Belas Artes da UFRJ.
Sua fotografia estava estampada em cartazes nos aeroportos, rodoviárias e outros lugares públicos; apontavam-na como uma subversiva perigosa. Ana Maria foi metralhada e morta na Mooca/SP, em 14 de junho de 1972. Estava com 25 anos de idade. Com ela, morreram Marcos Nonato da Fonseca e Iúri Xavier Pereira. Os três jovens e Antônio Carlos Bicalho Lana almoçavam no Restaurante Varella. O proprietário do estabelecimento, Manoel Henrique de Oliveira, que era alcaguete da polícia, telefonou para o DOI/CODI-SP avisando da presença de algumas pessoas que tinham suas fotos afixadas em cartazes de “Procurados”, feitos na época pelos órgãos de segurança. Os agentes do DOI/CODI, assim que se certificaram da presença dos quatro companheiros, montaram uma emboscada em torno do restaurante, mobilizando um grande contingente de policiais. De imediato, foram fuzilados Iúri e Marcos Nonato. Ana Maria ainda vivia quando um policial, ouvindo seus gritos de protesto e de dor, impotente perante a morte iminente, se aproximou desferindo-lhe uma rajada de fuzil FAL, à queima-roupa, estraçalhando-lhe o corpo. Ato contínuo, os policiais fizeram uma demonstração de selvageria para a população que se aglomerou em volta daquela já horrenda cena. Dois ou três policiais agarravam o corpo de Ana Maria e o jogavam de um lado para o outro, às vezes lançando-o para o alto e deixando-o cair abruptamente no chão. Descobriram-lhe também o corpo ensanguentado, lançando impropérios e demonstrando o júbilo na covardia de tê-la abatido. Não satisfeitos, desfechavam-lhe ainda coronhadas com seus fuzis, como se mesmo morta Ana Maria representasse ainda algum perigo. A população, revoltada com tamanha violência e selvageria, esboçou, dias depois, uma reação de protesto, tentando elaborar um abaixo-assinado que seria encaminhado ao Governador do Estado. Mas, devido ao clima de terror existente no País naquela época, somado ao pânico de que aquelas cenas de verdadeiro horror pudessem se repetir com eles, a iniciativa foi posta de lado. Também as ameaças feitas pelos policiais, na hora do crime, intimidaram os populares.
O Relatório do Ministério da Aeronáutica contém a falsa versão de que foi ferida após resistir à voz de prisão.

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ÁUREA ELIZA PEREIRA VALADÃO

MILITANTE DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PC do B)

Nasceu em 6 de abril de 1950, em Areado, sul de Minas, filha de José Pereira e Odila Mendes Pereira.
Desaparecida na Guerrilha do Araguaia, aos 24 anos.
Sua família morava na Fazenda da Lagoa, município de Monte Belo, onde seu pai era administrador e, por isso, Áurea Eliza teve que ir, muito cedo, para o internato.
Afetiva e risonha, sempre manteve um bom relacionamento com a família durante sua infância e adolescência.
Mudou-se, em 1964, para o Rio de Janeiro, para cursar o 2° grau no Colégio Brasileiro, em São Cristóvão, morando com sua irmã Iara, com quem tinha laços muito estreitos e afetuosos. Prestou vestibular, aos dezessete anos, para o Instituto de Física da UFRJ, em 1967, onde pretendia estudar Física Nuclear.
Participou intensamente do movimento estudantil no período de 1967 a 1970, tendo sido membro do Diretório Acadêmico de seu Instituto, juntamente com Antônio Pádua Costa e Arildo Valadão - seu marido -, ambos também desaparecidos.  
No início do ano de 1974, foi vista viva e em bom estado de saúde, no 23° Batalhão de Infantaria da Selva, pelo preso Amaro Lins, que prestou estas declarações no 4° Cartório de Notas de Belém/PA. Segundo depoimento de uma moradora de Xambioá, que não quis se identificar, Áurea foi vista morta na delegacia da cidade, e seu corpo estaria enterrado no cemitério local.
Em 1991, familiares de mortos e desaparecidos na Guerrilha do Araguaia estiveram neste cemitério junto com a Comissão de Justiça e Paz e a equipe de legistas da UNICAMP. Nessa ocasião, foram exumadas duas ossadas, uma de um negro, provavelmente Francisco Manoel Chaves (desaparecido) e outra de uma mulher, jovem, cujo corpo estava enrolado num pano de pára-quedas com a identificação arrancada, que poderia ser de Áurea. Em 1996, os restos mortais encontrados no cemitério de Xambioá foram identificados como sendo de Maria Lúcia Petit, outra guerrilheira assassinada no Araguaia.
O “Cordel da Guerrilha do Araguaia”, de autoria de D. Nonato da Rocha, assim se referiu à Áurea:

"Áurea era professora / E decidiu improvisar / Duma tapera, uma escola / Prá criançada estudar / Ela nada cobrava / Ensinava e brincava / Com as crianças do lugar."
  
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JANA MORONI BARROSO

MILITANTE DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PC do B)

Nasceu em 10 de junho de 1948, em Fortaleza/CE, filha de Benigno Girão Barroso e Cyrene Moroni Barroso.
Desaparecida desde 1974, na Guerrilha do Araguaia, quando tinha 26 anos.
Cursou o Instituto de Biologia  da UFRJ, onde ingressou na vida política. Trabalhou com outros companheiros, como responsável pela imprensa clandestina do PC do B.
Em abril de 1971, visando a continuidade de seu trabalho político, mudou-se para a localidade de Metade, no sul do Pará. Nessa região, além do trabalho da roça e da caça, foi professora primária. Casou-se com Nelson Lima Piauhy Dourado, também desaparecido. Era combatente do Destacamento A - Helenira Resende. Sua mãe, D. Cyrene, não poupou esforços à sua procura, indo várias vezes à região do Araguaia ou recorrendo aos órgãos governamentais à procura de informações sobre o seu paradeiro.
Desaparecida desde 2 de janeiro de 1974, após ataque das Forças Armadas, quando estava em companhia de Maria Célia Corrêa e Nelson Piauhy Dourado. Segundo depoimentos colhidos por sua mãe, Jana foi presa e levada para Bacaba, localidade às margens da Transamazônica, onde foi construído um centro de torturas das Forças Armadas. De acordo com os moradores da região, nesse local também se encontra um cemitério clandestino. Estava quase nua e com muitas arranhaduras pelo corpo. Foi amarrada, colocada em um saco e içada por um helicóptero. Isto teria se dado nas proximidades de São Domingos do Araguaia. O Relatório do Ministério da Marinha diz que foi morta, em 8 de fevereiro de 1974.
 “A Jana era uma pessoa muito estúdios; fazia parte do Grupo das Bandeirantes, foi chefe dos Lobinho; tudo isso em Petrópolis, onde morávamos e onde ela fez o curso secundário. Quando veio para o Rio fazer a faculdade, se engajou na União da Juventude Patriota (UJP). Foi então que começou a participar de movimentos políticos (...). Quando a Jana foi para o Araguaia, chamou a mim e ao pai, e disse que nós precisávamos entender que aquele era um trabalho muito sério. Meu marido pediu que ela me levasse junto. Jana explicou que não podia, e me deixou esse livro – Mãe, de Máximo Gorki -, com uma pequena cartinha, pedindo que eu só a lesse depois que ela tivesse partido. Meus outros filhos foram levá-la à rodoviária (...). Eu nunca podia supor que jamais iria vê-la de novo. Mas, na carta, ela me explicava que aquela era uma questão de ideologia, e talvez eu não a tivesse de volta (...)”.

Depoimento de Cyrene Moroni Barroso, mãe de Jana
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MARIA CÉLIA CORRÊA

MILITANTE DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PC do B)

Nasceu em 30 de abril de 1945, na cidade do Rio de Janeiro, filha de Edgar Corrêa e Irene Corrêa.
Desaparecida na Guerrilha do Araguaia, aos 29 anos.
Bancária e estudante de Ciências Sociais da Faculdade Nacional de Filosofia, hoje UFRJ, no Rio de Janeiro.
Em 1971, foi viver na região do Araguaia, onde já se encontrava seu irmão Elmo e sua cunhada Telma, ambos também desaparecidos. Pertenceu ao Destacamento A - Helenira Resende, da Guerrilha.
Foi vista pela última vez por seus companheiros no dia 2 de janeiro de 1974, e estava com Nelson Lima Piauhy Dourado, Jana Moroni e Carretel (todos guerrilheiros desaparecidos), quando houve um tiroteio contra os mesmos.
Os moradores de São Domingos viram quando Maria Célia era levada presa, com outros guerrilheiros. Segundo o depoimento de Maria Raimundo Rocha Veloso, moradora da região, Maria Célia foi presa por “Manezinho das Duas”, que a amarrou e levou com a ajuda de outro homem para o acampamento do Exército em Bacaba (Transamazônica).
Este depoimento foi confirmado por Geraldo Martins de Souza, delegado de São Domingos na época dos acontecimentos, que recebeu uma medalha do Comando do Exército na região por serviços prestados. Geraldo disse que “Rosinha”, nome com que era conhecida na região, foi presa no local chamado Açaizal.
Santinho, vereador pelo PSDB da Câmara de São Domingos, em 1991, e genro de Geraldo Martins de Souza, diz que eram duas as mulheres guerrilheiras levadas para Bacaba por seu sogro; uma delas era Maria Célia. Em todos estes depoimentos, as pessoas são unânimes em afirmar que estava viva e sem ferimentos de arma de fogo, em meados de 1974.
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MARIA REGINA LOBO LEITE DE FIGUEIREDO

MILITANTE DA VANGUARDA ARMADA REVOLUCIONÁRIA PALMARES (VAR-PALMARES)

Ex-integrante da Juventude Universitária Católica, foi aluna do Colégio de Aplicação da  UFRJ. Era formada em Pedagogia pela Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro. Enquanto aluna, teve intensa participação no movimento estudantil. Pedagoga, trabalhou no Maranhão e em Pernambuco pelo Movimento de Educação de Base. Após o golpe de 1964, ingressou no movimento Ação Popular e, posteriormente, na organização Var-Palmares. Regina foi casada com Raimundo Gonçalves Figueiredo, assassinado pelas forças da repressão, em 28 de abril de 1971. Foi morta aos 33 anos, em março de 1972. Deixou duas filhas menores: Isabel e Iara.
Maria Regina foi ferida quando a casa em que se encontrava, em Quintino, no Rio de Janeiro, foi invadida por agentes do DOI/CODI-RJ, no dia 29 de março de 1972. Lígia Maria Salgado Nóbrega e Maria Regina, juntamente com Antônio Marcos Pinto de Oliveira, foram presos e assassinados.
O corpo de Maria Regina chegou ao IML pela Guia n° 02 do DOPS, como desconhecida, vindo da Av. Suburbana, n° 8988, casa 72, Bairro de Quintino (RJ), como tendo sido morta em tiroteio. Entretanto, há testemunhas que afirmam que, após ser baleada na perna, foi levada para o DOI-CODI, onde veio a morrer horas depois, tendo, inclusive, sido levada para o Hospital Central do Exército.
Segundo consta do documento, foi identificada nesse mesmo dia 30, através de ficha do Instituto Félix Pacheco/RJ. No entanto, Maria Regina foi reconhecida por suas irmãs Maria Eulália, Maria Alice e Maria Augusta, em 7 de abril de 1972, quando, segundo estas, o corpo de Maria Regina foi finalmente identificado. Foi sepultada no dia seguinte, no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.
Fotos e laudo de perícia de local (n° 1884/72 e Ocorrência n° 264/72), feitos pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli/RJ mostram o corpo de Maria Regina baleado. O jornal “Correio da Manhã”, de 6 de abril de 1972, publicou a notícia de sua morte, sob o título “Terroristas Morrem em Tiroteio em Quintino” e, ao lado de sua foto, o nome de Ranúsia Alves Rodrigues, nome que constava do documento que portava. Naquele dia, Maria Regina ainda não havia sido identificada no IML/RJ, porque sobre ela não constava qualquer registro nos órgãos de repressão da ditadura.
sonia moraes angel jones
 


  
SÔNIA MARIA DE MORAES ANGEL JONES

MILITANTE DA AÇÃO LIBERTADORA NACIONAL (ALN)

Nasceu em 9 de novembro de 1946, em Santiago do Boqueirão/RS, filha de João Luiz Moraes e Cléa Lopes de Moraes.
Foi morta em São Paulo, em 1973, aos 27 anos.
Estudou no Colégio de Aplicação da antiga Faculdade Nacional de Filosofia e, posteriormente, na Faculdade de Economia e Administração da UFRJ, mas não chegou a se formar, sendo desligada pelo Decreto nº477, de 24 de setembro de 1969.
Casou-se, em 18 de agosto de 1968, com Stuart Edgar Angel Jones, militante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8).
Em 1° de Maio de 1969, foi presa em manifestação na Praça Tiradentes/RJ, sendo levada para o DOPS e, posteriormente, para o Presídio Feminino São Judas Tadeu. Somente foi libertada em 6 de agosto de 1969, quando foi julgada e absolvida por unanimidade pelo Superior Tribunal Militar. Passou a viver na clandestinidade.
Em maio de 1970, exilou-se na França, onde se matriculou na Universidade de Vincennes e, para se sustentar, trabalhou na Escola de Línguas Berlitz, em Paris, onde lecionava Português.
Com a prisão e desaparecimento de Stuart pelos órgãos brasileiros de repressão política, Sônia decidiu voltar ao Brasil para retomar a luta de resistência. Ingressou na ALN e viajou para o Chile, onde trabalhava como fotógrafa. Posteriormente, em maio de 1973, retornou clandestinamente ao Brasil, indo morar em São Paulo.
Foi assassinada sob torturas no dia 30 de novembro de 1973, juntamente com Antônio Carlos Bicalho Lana. Durante quase vinte anos a família investigou os fatos relacionados à prisão, tortura e assassinato de Sônia e Antônio Carlos.
Apesar de haverem identificado Sônia Maria, os seus assassinos enterraram-na, como indigente, no Cemitério Dom Bosco, em Perus, sob o nome de Esmeralda Siqueira Aguiar. A família de Sônia conseguiu obter através de processo de número 1483/79, na 1ª Vara Civil de São Paulo, a correção de identidade e retificação do Registro de Óbito.
Oficialmente morta, a família pôde trasladar seus restos mortais para o Rio de Janeiro, em 1981.
Em 1982, o IML/RJ constatou que os ossos entregues à família, enterrados no Rio de Janeiro, eram de um homem.
Para, finalmente, sepultar dignamente os restos mortais de Sônia, a família teve que fazer várias exumações, que chegaram a seis.

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